Economia

Auxílio emergencial: a pressão para prorrogar o benefício

A alta procura pelo auxílio emergencial aos informais, apelidado de ‘coronavoucher’, além de mostrar o impacto da pandemia de coronavírus sobre essa população, escancara a ignorância do governo sobre boa parte da sociedade brasileira. A nobre intenção do programa, que é chegar a brasileiros invisíveis que viram suas fontes de sustento sumirem devido o avanço da doença, evidenciou um dos sérios problemas do país, que é a escassez de dados sobre o próprio Brasil. Com isso, a medida, que previa inicialmente 98 bilhões de reais para o pagamento de três parcelas de 600 reais em até três meses para informais, autônomos e MEIs, já teve mais 24 bilhões de reais injetados e, agora, a área econômica já começa a ser pressionada para estender o benefício. A emergência irá durar mais do que apenas um trimestre.Auxiliares do ministro da Economia, Paulo Guedes, falaram com preocupação sobre o tema a VEJA. A dificuldade da área econômica é traçar como e por quanto tempo esse auxílio pode se estender, para que o ‘coronavoucher’ não vire uma herança da pandemia. Porém, é ponderado o risco político muito grande de retirar o auxílio logo após a fase mais aguda da pandemia, quando as consequências econômicas devem acertar em cheio a população. Por isso se trabalha a possibilidade de extensão.

O problema visto pela equipe econômica é que esse gasto extra se torne algo permanente, onerando ainda mais as contas públicas, já tão combalidas. Uma mudança permanente nos benefícios assistenciais, para o Ministério da Economia, deve ser discutida dentro da reforma tributária, na qual é necessário tempo e muita negociação. Caso isso aconteça, todos os outros programas sociais do governo, como o Bolsa Família e o BPC (Benefício de Prestação Continuada) poderiam ser substituídos pelo auxílio emergencial. Hoje, o primeiro atinge mais de 14 milhões de grupos familiares — sendo que parte deles passaram a ter o benefício substituído pelo auxílio emergencial — e outros 4,6 milhões recebem o benefício assistencial do INSS.

Inicialmente, o ‘coronavoucher’, que é comandado pelo Ministério da Cidadania, previa que auxílio atingiria 50 milhões de brasileiros, entre os informais e beneficiários do Bolsa Família. Porém, o número de brasileiros aptos a participar do programa é bem maior. O Dataprev, órgão que faz a análise dos cadastros, disse nesta terça-feira, 5, que mais de 95 milhões de pessoas podem ter direito ao auxílio. Até o momento, a Caixa informa que 50 milhões de brasileiros receberam os recursos. O aplicativo para cadastro continua aberto. Além disso, cerca de 16 milhões de pessoas que tem dados inconsistentes podem voltar a se cadastrar.

Apesar das soluções tecnológicas adotadas pela Caixa, como pagamento digital, com a bancarização de uma população até então excluída do sistema, filas e filas se formam diariamente em frente das agências bancárias com brasileiros querendo participar do programa. Os problemas estão desde a reclamação da demora do pagamento até a impossibilidade de se cadastrar, já que todo o processo é feito digitalmente. Chega a ser inocência do governo pensar que todos os informais, que não tem acesso a banco, teriam acesso a internet para conseguir, sozinhos, se formalizarem, como em um passe de mágica.

O público alvo do programa são brasileiros que não trabalham com carteira assinada ou recebam benefícios do governo (como aposentadoria e seguro-desemprego) e tenham renda familiar de até três salários mínimos (3.135 reais) ou, se não considerado o grupo familiar, de até meio salário mínimo (522,50 reais). Ou seja, o foco são pessoas pobres e não formalizadas. Esse número inclusive pode aumentar caso o presidente Jair Bolsonaro sancione o projeto de lei que tira o critério de pessoas isentas de Imposto de Renda em 2018. Até o momento, quem foi obrigada a declarar IR há dois anos, está fora do programa.

Apesar de o programa já estar funcionando há quase um mês, ainda há muitas caneladas na operacionalização dele. O problema do orçamento e a vontade de mostrar uma eficiência acima do que realmente acontece, fizeram com que o ministro da  Cidadania, Onyx Lorenzoni, e a própria Caixa passarem por constrangimento. A pasta e o banco tiveram de voltarem atrás do adiantamento do calendário da segunda parcela. Na ocasião, Onyx teve a atenção chamada publicamente pelo presidente Jair Bolsonaro. A consequência é que, até o momento, não há o calendário nem da segunda e nem da terceira parcela. O caso foi parar no Ministério Público Federal. Portanto, não se sabe quando o dinheiro efetivamente chegará às mãos dos brasileiros que mais precisam.