Para o juiz Alexandre Takaschima, titular da 2ª vara Criminal da comarca de Lages, esse é um importante passo dado no combate à violência doméstica. “Vejo como avanço as alterações trazidas à Lei Maria da Penha, reconhecendo a violência psicológica como algo que não pode ser aceito como normal nos relacionamentos. Recordo de uma mulher que em audiência, aos prantos, afirmava que a dor física passou, mas o trauma e a dor psicológica ela não conseguia superar”.
Esse novo crime será atribuído a quem causar dano emocional “que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões”. Ele pode ocorrer por meio de ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, chantagem, ridicularização, limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro método.
Como exemplo desse tipo de agressão, o magistrado recorda do relato de uma mulher ao dizer que quando havia discussão com o companheiro, ele pegava a arma de fogo e dormia com o revólver sob o travesseiro, gerando pânico nela. “Infelizmente também é muito comum mulheres falarem de episódios em que os namorados, companheiros, esposos ridicularizam seus corpos ou forma de se vestir, causando baixa autoestima e em alguns casos depressão”.
Atendimentos
A Rede Catarina, um programa da Polícia Militar de Santa Catarina direcionado à prevenção da violência doméstica e familiar, identifica a violência psicológica na maioria dos casos atendidos em Lages. Integrante da guarnição especial, a policial Camila Santos Athayde Correa diz que esse tipo de agressão está associado à outras formas de violência contra mulher. “Elas nos relatam o que sofrem. O xingamento e a humilhação sempre estão incluídos. Muitas falam do ciúme possessivo dos companheiros e que eles atribuem a elas uma possível traição. Além de proibirem usar determinadas roupas e até mesmo sair de casa”.
Quando as vítimas apresentam esse tipo de situação durante as visitas, os policiais orientam que busquem o amparo psicológico gratuito na Secretaria Municipal de Políticas para a Mulher, denunciem os agressores e registrem a ocorrência.
Sinais da violência psicológica
Uma equipe técnica na Secretaria da Mulher fará o acolhimento dessas vítimas. Essas profissionais destacam que a violência psicológica é sutil e cumulativa na maior parcela dos casos. O abusador não reconhece os sentimentos da vítima e é sistemático. O que dificulta, inclusive para a vítima, em reconhecer os danos causados. As psicólogas dizem que é possível perceber se essa forma de violência está ocorrendo com familiares, amigas, vizinhas ou colegas de trabalho. Alguns sinais podem ser detectados como, por exemplo, quando há isolamento e a mulher se recusa estar em ambientes sociais, não atender telefonemas, não receber visitas e ausência de comunicação.
Destacam que, estando em ambientes de interação social, o comportamento delas pode ser calado, olhar distante, dificuldade de concentração e o choro fácil. Outro momento é durante a comunicação, com o cuidado excessivo na escolha das palavras e discurso cauteloso sobre o relacionamento familiar. Ainda, na escolha de vestimentas. Baixa autoestima, dificuldade de autoaceitação, através de falas que desqualificam a si própria, que trazem sentimento de não ser capaz e demonstração de medo em situações cotidianas, como ir ao supermercado por exemplo. Outro sinal dessas mulheres está na tentativa de justificar ou minimizar o comportamento agressivo do companheiro.
“Uma das melhores formas de detectar a violência doméstica é perguntando a vítima. Mas é preciso não ter receio de abordar o tema, estar em ambiente reservado, oferecer espaço de escuta atenta e empática, não emitir julgamento de valor, e principalmente assegurar que qualquer ação somente acontecerá com o consentimento da mulher”, destacam lembrando que a rede pode ser fonte de segurança e suporte a essas mulheres, oferecendo através do acolhimento e da informação a possibilidade de quebra do ciclo da violência.
Para pedir medidas de proteção
Os casos de violência psicológica deverão ser comunicados à Delegacia mais próxima para que haja a solicitação das medidas protetivas de urgência e a investigação criminal; poderão ser solicitadas por meio de advogada (o) ou, ainda, na Secretaria Municipal de Políticas para a Mulher. “Importante é que as mulheres tenham consciência que nenhum tipo de violência é aceitável em um relacionamento e que existe a possibilidade de protegê-la com o afastamento do homem autor de violência, proibir a aproximação e o contato por qualquer meio de comunicação, além de outras medidas, inclusive para proteção patrimonial”, ressalta o juiz Alexandre Takaschima.